Logo
Jogos da Juventude

Do Oiapoque aos Jogos da Juventude! Nadadora amapaense vence barreiras para competir contras as melhores do país

Mel, de 15 anos, é ribeirinha e aprendeu a nadar na fronteira entre o Amapá e a Guiana Francesa, como meio de diversão e sobrevivência. Ela conta que esporte foi um refúgio dos problemas

Por Comitê Olímpico do Brasil

13 de set, 2023 às 07:00 | 3 min de leitura

Compartilhe via:

O nado sempre foi um meio de sobrevivência e diversão para Maryelle dos Santos da Paixão. Como  um peixe, a jovem de 15 anos teve durante toda a vida o Rio Oiapoque, quase na fronteira entre o Amapá e a Guiana Francesa, no extremo Norte do Brasil, como casa. Nem ela nem a família imaginavam que um dia a menina pudesse competir contra as melhores do país em sua idade. Mas, depois de muitas aventuras, ela realizou o grande feito na última terça-feira (12), nos Jogos da Juventude Ribeirão Preto 2023.

Mel, como é conhecida, é uma batalhadora na vida e no esporte. Não teve até hoje as condições ideais para se desenvolver como atleta. Tímida, mal saía de casa. Ela vive na Prainha, uma comunidade ribeirinha em Clevelândia do Norte, distrito de Oiapoque, e 660km da capital Macapá. Mas o fato de contar nos dedos de uma mão o número de vezes em que caiu em uma piscina olímpica não a impediu de se sagrar campeã amapaense de natação nos 100m livre e, com o resultado, garantir a classificação para o grande evento organizado pelo Comitê Olímpico do Brasil. 

"Sou ribeirinha, então aprendi a nadar desde muito nova para sobreviver. Mas nunca tinha pensado em fazer natação. Quando surgiu a oportunidade, eu fui. No começo, nem falava direito com ninguém, mas conheci muitas pessoas na minha primeira vez, lá no meu estado. Aqui é a segunda competição que eu disputo e tem muito mais gente. Fiquei um pouco ansiosa. Vi uma menina de 15 anos muito forte, com mais corpo do que eu. Na minha mente, as pessoas aqui não seriam tão legais por eu ser quem sou, mas até que foram", disse a tímida nadadora.


Em Ribeirão Preto, a amapaense terminou entre as últimas nos 100m livre e não quis saber de olhar o lado bom da história. Mesmo competindo contra o cansaço da viagem, que terminou horas antes da prova, e oponentes acostumadas a treinar todos os dias, ela conseguiu reduzir sua melhor marca em quase 8 segundos.

"Não fiquei satisfeita. Poderia ter nadado melhor. Mas ainda quero voltar e ser campeã", declarou Mel, que nas poucas oportunidades que teve até hoje de treinar contou com o auxílio do Cabo Castilho, nadador indígena e destaque local por vencer competições entre os Exércitos brasileiro e francês. 

Mel conta que no início deste ano, quando ficou sabendo pelos colegas de escola que os alunos teriam a oportunidade de fazer aulas de natação, não queria ser convocada. Embora soubesse do próprio potencial devido aos anos de prática no rio e nas cachoeiras, a filha da pedagoga Joana e do pescador indígena José Maria tinha dificuldade de aceitar o próprio corpo. Ela ainda reluta ao se expor em qualquer oportunidade, mas o esporte se mostra uma escolha acertada e desperta o seu lado mais competitivo. 

"A natação foi um escape dos problemas, um refúgio. Minha melhor amiga teve que se mudar para Rio Branco. Poderíamos ter nadado juntas, mas eu passei na seletiva e ela não. Foi difícil aceitar. Sei que ela está torcendo por mim. Para chegar até aqui tem que ser no mínimo bom. E eu acho que sou boa. No rio, tem a correnteza que puxa bastante. Já treinei muitas vezes na cachoeira, que é bem pesada. Na água parada, é mais favorável. Se eu tiver a oportunidade de treinar mais, farei isso", conta a nadadora, que tem o apoio da Escola Estadual Duque de Caxias, onde estuda desde os 11 anos e atualmente cursa o 9º ano do Ensino Fundamental.


Rio Oiapoque, no extremo norte do Brasil, tem sido o palco dos treinos de Mel até hoje

"Para participar da etapa estadual, abrimos inscrições e fizemos uma seleção na piscina de outra escola em Oiapoque. Percebemos, então, que a Mel se destacava no meio dos outros estudantes. Vimos o potencial e a oportunidade de mostrar seu talento. Treinou poucos dias, nós a mandamos para os Jogos Escolares Amapaenses e ela foi campeã", conta Aldo Pantoja, diretor da escola.

Para chegar a Ribeirão Preto, Mel precisou encarar outra sequência de aventuras, que causaram bem mais ansiedade do que as braçadas no Rio Oiapoque e em suas cachoeiras. No domingo, saiu de casa com o irmão Inácio em uma canoa motorizada. Logo sua mochila caiu na água e, na tentativa de recuperá-la, o motor da embarcação falhou. Os jovens ficaram à deriva e foram auxiliados por garimpeiros para chegarem do outro lado do rio.

Depois, foi preciso viajar de carro de Clevelândia do Norte até a sede do município de Oiapoque. Lá, Mel embarcou de ônibus rumo a Macapá, com direito a um susto, pois o veículo quebrou na estrada. Em seguida, pegou um avião pela primeira vez na vida, com conexão em Brasília até o interior de São Paulo. A família e os treinadores tentam mostrar a ela a importância dos objetivos alcançados e as possibilidades que estão por vir. 

"Nunca imaginei que minha filha fosse participar de uma competição assim. Estamos muito felizes e orgulhosos dela. Uma menina daqui do Norte, da beirada, como a gente fala, em um campeonato tão importante. Fiquei muito temerosa de não poder estar, mas incentivei, pois sei que ela é merecedora", disse Joana, que é pedagoga na aldeia indígena Cunanan.

Natação nos Jogos da Juventude

As competições de natação dos Jogos da Juventude Ribeirão Preto 2023 tiveram início na terça-feira, com a definição dos medalhistas das seguintes provas: 4x100m livre masculino, 50m peito feminino, 100m costas masculino, 400m medley feminino, 100m peito masculino, 100m costas feminino, 4x100m livre masculino, 4x50m livre feminino, 200m medley masculino, 100m livre feminino, 100m borboleta masculino, 200m borboleta feminino, 200m livre masculino, 4x100m medley misto e 800m livre feminino.

Nesta quarta-feira (13), serão disputados os 50m borboleta feminino, 50m costas masculino, 100m peito feminino, 50m livre masculino, 200m costas feminino, 4x100m livre misto, 800m livre masculino, 50m costas feminino, 50m borboleta masculino, 400m livre feminino, 200m peito masculino, 200m medley feminino e 4x50m livre masculino.

ÚLTIMAS NOTÍCIAS